sexta-feira, 9 de maio de 2014

Edição nº. 59






PAPO NA CONFRARIA: PÉRICLES PRADE

1 - O que te motivou a escrever?

 Escrevi o primeiro poema aos 9 anos, no dia do aniversário de minha querida mãe, motivado pelo amor a ela dedicado. Foi algo natural, já que não tinha formação literária à época. A partir daquele evento, escrevi outros, esporadicamente, consolidando a vocação poética apenas aos 16, quando iniciei a redação do livro Este Interior de Serpentes Alegres, publicado e revisto em 1963. Cristalizou-se a ficção, nascida aos 15 anos, mais tarde, entre 1965 e 1970, quando veio a lume Os Milagres do Cão Jerônimo. A grande motivadora foi, sempre, a leitura constante das obras universais de repercussão canônica.  

2- Cite os TRÊS livros (e respectivos autores) mais significativos em tua vida?

A Bíblia (O Apocalipse de São João), Don Quijote de La Mancha (Miguel de Cervantes Saavedra) e O Livro das Mil e uma Noites (anônimos, ramo Sírio).

3- Indique um livro (Literatura Brasileira) para leitura de:
a) Alunos do Ensino Fundamental (5ª a 8ª séries):
Alice no País das Maravilhas (Lewis Carrol)
b) Alunos do Ensino Médio:
Robinson Crusué (Daniel Defoe)
c) Alunos do Ensino Superior:
O Processo (Franz Kafka)

4- Como se dá o processo da escrita em tua prática cotidiana?

Primeiro, construo os poemas, mentalmente, para em seguida repassá-los ao papel, trabalhando-os até atingir o nível (forma/fundo) considerado ideal. Quanto à ficção, o processo é assemelhado, no plano da construção, mas quando escrevo as narrativas à mão, a exemplo daqueles, interfiro às vezes de tal modo que nada têm a ver com o prévio esboço mental.

5- Fale sobre o apoio dispensado pelos setores público e privado à literatura.
            
O apoio dispensado é mínimo. No setor privado, não mais existem mecenas como havia na Renascença. No setor público, prevalece o interesse político. A área da Cultura é sempre posta à margem. Santa Catarina é um exemplo marcante do abandono.

6- Fale sobre o papel das Academias de Letras em relação à Língua e à Literatura?
            
As Academias (ao lado das Universidades) constituem os poucos redutos onde a Língua e a Literatura ainda são estudadas. Contudo, em geral prevalece um certo narcisismo intelectual, preocupando-se os membros mais com a divulgação de suas obras do que a finalidade precípua das instituições.  Malgrado essa realidade, seu papel contínua indispensável ao aprimoramento/desenvolvimento da Cultura, devendo, no entanto, cada qual descer da Torre de Marfim para abrir-se mais às comunidades carentes de sua efetiva influência. 

(Membro da cadeira nº. 28 da Academia Catarinense de Letras)








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GABRIEL GARCIA MARQUES (1927 – 2014) – HOMENAGEM


Memória de minhas putas tristes, de Gabriel Garcia Márquez (Prêmio nobel de literatura de 1982), editado pela Record em 2008, com tradução de Eric Nepomuceno é uma inesperada e surpreendente história de amor entre um ancião e uma ninfeta e se insere numa tradição da qual fazem parte Vladimir Nabokov de Lolita, o Thomas Mann de Morte em Veneza e Yasunari Kauabata de A casa das belas adormecidas.

Um leitor mais atento vai encontrar nessa obra as principais referências e motivações desse hino de louvor à vida e, por extensão, ao amor, já que um não existe sem o outro no imaginário de Márquez. Apesar de parecer estranho, uma dessas chaves está no conto de fadas A bela adormecida, que, não por acaso, é citado em um momento crucial dessa narrativa ambientada em uma cidade colombiana imaginária, numa época que de tão remota parece imemorial.

A semelhança com a famosa fábula do escritor francês Charles Perrault fica mais explícita na adolescente, que aqui surge dormindo, como se estivesse à espera do seu príncipe encantado. Mas ela também está presente no velho jornalista, narrador dessas memórias, que vai viver cerca de cem anos de solidão embotado e embrutecido, escrevendo crônicas e resenhas maçantes para um jornal provinciano, dando aulas de gramática para alunos tão sem horizontes quanto ele, e, acima de tudo, perambulando de bordel em bordel, dormindo com mulheres descartáveis.

Só quando acorda ao lado da ainda pura ninfeta Delgadinha é que este personagem vai ganhar a humanidade que lhe faltou enquanto fugia do amor como se tivesse atrás de si um dos generais que se revezaram no poder da mítica Colômbia de Gabriel Garcia Márquez. O medo do amor é tão superlativo que o anti-herói dessas memórias vai preferir conviver com a mais terrível ameaça para o macho latino: o fantasma da impotência. E enquanto tivesse forças, resistiria ao poder do amor.

Parte desse medo se deve aos ridículos a que o amor nos expõe, aqui elevado à última potência em cenas como a que o ancião anda numa bicicleta cantando “com ares do grande Caruso”, ou aquela em que destrói um quarto de bordel. E por mais que lidemos com esse sentimento como se fosse um paletó dois números acima do nosso, apenas ele e tão somente ele, o amor, nos faz humanos, como desde tempos imemoriais a arte vem tentando provar. Seja nos boleros mais sentimentais, que ressoam nas paixões evocadas pelos grandes mestres da ficção, ou em obras-primas, como esta. Vale a pena ler!

(Este texto foi publicado na última edição 58 deste Blog, na Série “Li e Recomendo”)



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DA SÉRIE “POETAS MULHERES” - 1




RELVA


Cai a cabeça
       No peito
       Sem jeito.

Busco esperança
            No fundo
            Do mundo.

Onde te achar,
            Céu perdido
            Rio corrido?

Onde te ouvir,
           Brisa fina
           Eu menina,
A caminhar
Sobre a relva do tempo?

(Mila Ramos, Sete rumos, Edições Sanfona, Florianópolis, 1985)


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HIPER-REALISMO

para o homem
         de morte
         a mulher
         de mente

para a mulher
        de veneta
        o homem
        de vagar

em marte vênus
mesmo endereço
cama closet sofá

homens versus mulheres
                                            :
                             so close
                             so far

(Valéria Tarelho, livro da tribo, São Paulo, 2012, p.15)


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LEMBRANÇAS

Que presença é essa
que permanece intacta 
feito parede
solicitante
precipitando imagens 
vultos desfragmentados e ocos
colada ao corpo
arruaceira
galopante 
espreita meu cansaço

(Cristina Martins Branco , Facebook, 21/04/2014, Porto Alegre)

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HÁ UMA LUA LÁ FORA...

Atrevem-se os amantes
a galopar impunes
pelos precipícios da paixão.
Sentidos iluminados,
simbióticos e extasiados
viajantes em aflição.
Benditos, à luz dos aflitos,
sufocam apelos e gritos
em penitente confissão.

(Rosangela S. Goldoni, São Paulo, 18 03 2014)

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ZOOM

[sg]

por baixo de
esparsos fios brancos
pequenas rugas amargas
mágoas disfarçadas
dores mudas
discreta flacidez
delicadas estrias
intensas indignações
palpita meu coração de 1983


(Adelaide do Julinho, Facebook, 23, 04, 2014 Belo Horizonte)


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" ... Mato meu modo de ser
Quando tento em palavras
Transformar o que sinto...
É tudo tão sem dimensão,
Tão sem razão de ser
Que sinto o quanto não sou...
E quando em mim tento
Reter o meu modo de ser,
Transbordo o que não me cabe
E assim é o 'quando' e 'onde' Vivo... "

(Dú♥Karmona® Facebook, abril,2014)


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LI E RECOMENDO (5)








FAZES-ME FALTA (Inês Pedrosa)

Sucesso de público e crítica em Portugal e no Brasil, Fazes-me falta é um marco na obra de Inês Pedrosa, uma das mais importantes escritoras portuguesas da atualidade. Com uma linguagem sutil, envolvente, Inês compõe uma narrativa com duas vozes distintas – um homem e uma mulher – que se entrecruzam em breves monólogos e, gradualmente, nos apresentam sua intensa relação, num estado indefinível entre paixão e amizade.

Mas esses são personagens que dialogam num contato partido insólito. Pois a mulher, cuja voz inicia esse romance surpreendente, morreu ainda jovem. É ela, no entanto, quem ampara seu companheiro da perda e da solidão. Entre as lembranças de encontros e desencontros, caberá a ambos dizer o que nunca puderam pronunciar em vida, e curar antigas cicatrizes do passado.

Inês Pedrosa nasceu em Coimbra, Portugal. Trabalhou no rádio e na televisão, é colunista do semanário português Expresso e diretora da Casa Fernando Pessoa, em Lisboa. É autora de contos, crônicas, ensaios biográficos e antologias, e dos romances A instrução dos amantes (1992), Nas tuas mãos (1997) – vencedor do Premio Máximo de Literatura – e A eternidade e o desejo (2007), publicado no Brasil pela Alfaguara.

“Não importa o que se ama. Importa a matéria desse amor. As sucessivas camadas de vida que se atiram para dentro desse amor. As palavras são só um princípio – nem sequer o princípio. Porque no amor os princípios, os meios, os fins são apenas fragmentos de uma história que continua pala lá dela, antes e depois do sangue breve de uma vida. Tudo serve a essa obsessão de verdade a que chamamos amor. O sujo, a luz, o áspero, o macio, a falha, a persistência”.

Editado pela primeira vez em 2002, pela Publicações Dom Quixote. Li a edição publicada pela Alfaguara de 2010.



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(Arte de Michele, do Café do Mineiro - Lagoa da Conceição - Floripa - 07/05/14)


DA SÉRIE “NOSSA LÍNGUA”

Pleonasmos que devem ser evitados

  • Subir para cima
  • Descer para baixo
  • Elo de ligação
  • Acabamento final
  • Certeza absoluta
  • Juntamente com
  • Em duas metades iguais
  • Há anos atrás
  • Vereador da cidade
  • Outra alternativa
  • Anexo junto à carta
  • Recuar para trás
  • Todos foram unânimes
  • Conviver junto
  • Encarar de frente
  • Fato real
  • Multidão de pessoas
  • Cardume de peixes
  • Amanhecer o dia
  • Retornar de novo
  • Surpresa inesperada
  • Gritar bem alto
  • Entrar para dentro
  • Sair para fora
  • Protagonista principal
  • Voltar a repetir
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DA SÉRIE “PARA [SÓ] RIR”

A morte do Marcão (autor desconhecido)

Marcão era um antigo funcionário de uma cervejaria no interior de São Paulo.
Ele era feliz no trabalho, embora seu sonho fosse ser degustador de cerveja, bebida que tanto adorava.
Certa vez, trabalhando no turno da noite, ele caiu dentro de um tonel de cerveja.
Pela manhã, o vigia deu a triste notícia:
- É com profundo sofrimento que informo que o Marcão se desequilibrou,
caiu no tonel de cerveja e infelizmente morreu afogado.
Um grande amigo de Marcão com a voz muito triste pergunta:
- Meu Deus!!! Será que ele sofreu???
O vigia então responde:
- Acredito que não, porque, segundo as imagens da câmera de segurança,
ele chegou a sair três vezes do tonel para urinar...


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CONFRARIA DO [meu] POEMA-pn





POEMA ÀS MÃES


                             

Mãe,
eis-me aqui mais uma vez
enfrentando meu espelho.
A cada novo ano,
desde que brotei do teu útero,
me confronto com teu rosto.

E me questiono:
O que fiz com teus conselhos?
              com teus exemplos?
              com a minha vida?

Mãe,
teu tempo é de contemplação
o meu tempo é de inquirições
e hoje só restam inquietações.

Aceite mãe
meus reparos.
Perdoe-me as falhas
as folhas ao vento.
Me embale,mãe.
me deixe voltar

para a proteção do teu ventre.

( Pinheiro Neto, homenagem às mães em Maio/2014)